Entreevista para Imprensa Pernambucana
Paulo Alexandre cordeiro de vasconcelos -responde-
Como a criança desenvolve o gosto por jogos?
Jogar, brincar é um comportamento inato dos mamíferos como um todo.Portanto HUMANOS OU NÃO BRINCAM, JOGAM. Os estudos ligados a Zoologia- Etologia -cooperaram no entender o jogo humano, como a exemplo nos estudos de Piaget em que ele aponta para essas colaborações.
Jogar é uma atitude nos humanos mais complexa pois se dá nos planos além de motor, físico, sobretudo no campo das linguagens, dos signos, no patamar do dar sentido -brincar de dar sentido-; Daí sua complexidade Semiótica- ,ou seja, ao brincar estabelecemos além de uma presença física , corporal, entramos no campo do psíquico, do cognitivo e assim nos patamares da linguagem e da inteligência e da cognição mediante os signos.
2) A criança aprende muito mais rápido que os adultos (isto me parece um fato, estarei falando besteira)?). Como ela está inserida num mundo com novas tecnologias que mudam tão rapidamente?
A primeira e fundamental tecnologia humana é a própria inteligência, mediada pelos signos, esta é imbatível e sobre essa se montam todas a s demais, inclusive todas as linguagens.Assim ,portanto , a escrita é uma tecnologia.A criança ao brincar explora o mundo das linguagens e simultaneamente a inteligência, e suas estruturas complexas.Ela – a criança -tem uma facilidade maior no sentido de muitas vezes não respeitar códigos, canais e recriar tudo, portanto processando um universo criador.Ela não fica presa aos estereótipos, ele passa por cima , muitas vezes,pelo prazer de recriar, mexer, dar nova cara.
As tecnologias da informação e comunicação trazem novos esquemas complexos, novos códigos,novos degraus matemáticos e assim estabelece do mesmo modo relação lúdica com a criança.Ela tem um desejo de brincar de acertar e errar, sem preconceito de qualquer espécie,aliás,essa fonte de querer sempre inovar trata-se de uma questão moral , no sentido de mostrar que pode, que tem poder. Lembremo-nos dos hachker-observe se esta correto a palavra-.
O que não se pode é sempre substituir o concreto pelo sígnico, pelo representacional, caso das tecnologias da informação.Há que se dosar uma coisa e outra em seu tempo certo.Mas sem dúvida os jogos,os games na rede são materiais que desenvolvem a qualidade e estrutura da inteligência complexa e matemática da criança.
Os estudos de Sherry Turkle- A Vida no Ecrã – demonstram a facilidade da criança operar com a informática até por comparar a máquina a algo vivo, comparando com os estudos de Piaget , em que este afirmava que há uma tendência na criança em operar antropomorficamente em comparar o que é ativo ao que tem vida.Neste aspecto a inteligência da máquina lhe da uma magia de um outro próximo.
3) Qual a função do jogo no aprendizado infantil? Isto pode ser utilizado para os adultos (jogo como forma de aprender)?
Todo jogo é aprendizado,é laboratório de sentido, é experimentação .O jogo é uma estratégia ao desenvolvimento do conhecimento, da inteligência, no sentido de apreender a ligar, juntar , associar, a adaptar, é exatamente isso que Piaget.Wallon e Vygotsky viram no jogo.Uma função estratégica vital para o desenvolvimento e da aprendizagem, da mesma forma que os adultos.Funcionamos também testando e nisso temos o preconceito, por sermos adultos, de dizer que jogamos.Todos nós humanos jogamos complexamente, até na guerra, nos sonhos, na competitividade do dia a dia.
No próprio ensino superior, a distancia jogamos na escala de acerto e erro, na busca de sentido, do conceito, da meta.O jogo é sobretudo isso busca de sentido.O que é o hipertexto, senão um rizoma que se busca elastecer para a construção de informação, comunicação e saberes?O problema é como democratizar esta tecnologia, no sentido de favorecer maior número de pessoas que é tão restrito ainda no mundo e no Brasil em especial.
Ainda não se brincou na Escola com o rádio, com a tv , com o cinema, com o vídeo, muitas vezes nem no ensino superior , salvo as escolas de comunicação e olhe lá. Essas tecnologias ainda não estão verdadeiramente democratizadas, que dirá a informática, a rede mundial, que requer aparatos caros, bem como para sua manutenção e atualização, sem se falar no impasse lingüístico, das diferenças, do inglês, do chinês , do russo, do alemão etc....Ainda falta muito para uma democracia do jogo de linguagens e tecnologias, mas todos nós queremos isso.
4) Como foi a pesquisa para o seu livro?
Meu livro é uma síntese do meu Mestrado , na ECA-1993, e ele partiu das minhas experiências com crianças do Recife- Pe, de – Campina Grande -PB e de São Paulo.
Parti do fato que crianças analfabetas brincavam, criavam brinquedos complexos, que exigia um conhecimento básico, concreto da Física, da Química, por exemplo, no sentido de saber se apropriar de materiais e de suas resistências pra aglutinação ,como juntar metal e madeira, madeira e plástico etc...E com esta indagação percebi que o brincar ensina, faz uma aprendizagem e , mais com prazer, ás vezes , claro com tensões, mas no superar esta última produz alívio prazer.
Assim caminhei para entender Piaget e outros interacionistas –Vygotsky- , ou os não interacionistas, como a Psicanálise –Freud e Lacan,que me explicassem o jogo como motivador da aprendizagem, do conhecimento, do sujeito e da construção da identidade e ,nesse sentido, o livro mostra este meu trajeto, inclusive entendendo o que vem a ser infância, e com ela, como se estimula ou se adentra ao jogo.Da mesma forma como a Psicologia e a Pedagogia caminharam para capturar o jogo como algo de valor para a construção do conhecimento e do aprendizado.
5) A criança pode participar de Ensino a Distância? Explico: no Brasil, a cultura de EAD está implementada em adultos, mas nos EUA se fala em EAD para crianças. Isto é possível?
Os estudos no geral, com foco neste tema, as pesquisas no Brasil ainda são incipientes, mesmo sem esquecer as iniciativas paulistas, cariocas, gaúchas mineiras, mato grossense baianas,pernambucanas ,paraibanas cearenses, e tantas outras sobretudo ligadas às universidades públicas , contudo não denotam a eficácia e diagnóstico de uma aprendizagem a distancia com detalhes para a faixa infanto-juvenil.
Quanto à área de adultos estamos caminhando ainda .As empresas privadas têm progredido bastante, as universidades, como vocês, tem dado longos passos, mas nada em especial sobre a criança.A educação brasileira não anda bem no plano infanto-juvenil, que dirá com alfabetização digital.Refiro-me sobretudo ao ensino público.
Há alguns estudos americanos ligados a informática e a rede mundial com algumas críticas ao ensino , informática e a rede,nas pessoas de Sherry Turkle e Alison Amstrong entre outros, afora alguns franceses e espanhóis-UNED-e a Cátedra da Unesco de Educação a distancia-CUED e portugueses –Da Universidade Nova Lisboa, os ingleses .Na América Latina ainda é muito iniciante.
a pesquisa neste foco .
A Argentina vinha com planos sérios sobre este foco , mas diante da sua crise alguns percalços vieram a obstruir o desenvolvimento.Penso que precisamos tratar o caso com muita delicadeza, até porque como falei, a criança precisa até o término da quarta série,ao menos, do ensino fundamental presencial, ate porque, do ponto de vista construtivista isso é fundamental.A interatividade presencial é absolutamente sem concorrência. A presença é presença , tridimensionalmente e do ponto de vista ´perceptivo cognitivo .Isto é inquestionável. A didática aplicada precisa participar de modo ativo para efeito de uma ação crítica nesta área, especialmente na conjunção com a Informática, enfim com as Ciências Cognitivas, como bloco, especialmente aqueles que atuam tutorialmente em comunidades
A dispersão na infância e juventude é grande, e o modo presencial , claro, de qualidade é imbatível, permite um melhor controle didático dessa dispersão assim como aumenta o contato físico e afetivo, que é fundamental nesta faixa etária.Apreender inicialmente é afetar este sujeito de modo mais profundo possível e com perspectivas de aproximação afetiva, de sentimento de corporeidade.
Algumas escolas do ensino fundamental particular já adotam a estratégia via web para efeito de tarefas de casa e assessoria a criança no geral curricular e, claro,o jogo o brincar é profundamente explorado nesta via de uso, ou uma linguagem aglutinada a uma discursividade e textualidades lúdicas..E nessa mesma via é preciso pensar as diferenças sociais infanto-juvenis para que se possa mesclar um conteúdo e seu lúdico assim precisamos selecionar: ferramentas, brownsers , mais adaptados, assim como um especialista em interatividade - cognitiva.
Temos buscado trabalhar tais questões no Curso de Pedagogia da Universidade Anhembi –Morumbi, na habilitação de Tecnologia Educacional.O grande problema é a pesquisa, o tempo , que os alunos não dispõem para aprofundar as questões críticas da pesquisa, tendo como contraponto à velocidade do tempo, na informação/comunicação que hoje voa, e portanto exige uma prontidão permanente nas pesquisas.Todavia temos tido alguns resultados positivados , com destaque pela contribuição de alunos da universidade -com as escolas públicas.
Em suma , creio que como modo complementar à ação educativa a distancia é boa ferramenta, mas sempre sublinhando - como caráter complementar para efeito de jovens em formação fundamental.
6) O mundo infantil de hoje é muito diferente daquele que Piaget estudou? Reflita um pouco sobre este tema?
O tempo, os sistemas sociais alteraram-se, os sistemas ecológicos mudaram, nós mudamos, e assim a infância e juventude mudaram.O tempo cognitivo alterou-se, os espaços , tempos , modos de informação e comunicação mudaram .Mas a cognição como estrutura permanece imbricada nos mesmos paradigmas interacionista cognitivos, outras variáveis , claro mudaram, como as citei aqui.
Creio que Piaget não se assustaria com o que vivemos, ele fez prognósticos sobre isso , nos deu pistas para este Ciberespaço, mediado pela inteligência.Os estudos de Piaget, Chomsky sobre os paradigmas das linguagens, entre outros autores nos orientaram sobre a inteligência artificial.Contudo o resultado da combinatória capitalismo e investimentos tecnológicos da informação e comunicação alterou muito a nós.
Os jogos mudaram, a sociedade de consumo , inverteu os valores humanos, jogar hoje é também participar do consumo, não o consumo de sobrevivência,mas aquele de mero prazer ostentatório,prodigalizados pela mídia e publicidade.O jovem joga um jogo do tempo capitalista, da angústia do mercado, joga economicamente sempre e o tempo todo para poder se ver como o estereótipo que a sociedade de consumo impôs.
O tempo foi recortado, sobreposto há outros tempos, o lazer misturou-se ao não lazer,nos perdemos nisso.O tempo de cognição é construído sobre a égide do valor econômico, aprende-se hoje para ganhar e ganhar economicamente, não há uma contemplação ao ganhar humano mais intenso como antes a Filosofia humanista apregoou.
Há um tempo de cognição que pede contemplação, no sentido de tempo para depurar, e exige-se do jovem muito, e mais ele ficou mais submetido ao despudor do capital, da mecânica do mesmo, desde o nascimento e todo seu percurso de vida.O mundo globalizado é o mundo do capital dos poderosos -do capital- e com eles as suas estratégias inclusive as tecnológicas.
7) Por fim, qual o conselho que o senhor dá para os pais construírem uma educação sadia para seus filhos?
Acho que o bom senso é sempre o mestre, jogar com os filhos é acompanhar, ou tentar acompanhar, despojar-se para re-aprender os novos jogos, é observar novas tipologias de jogo, do brincar é adentrar a esse imaginário humano que sempre estamos em completo fervilhamento. São perceber novas regras, novos espaços, novos conteúdos, novas tendências. Penso que partilhar dos novos jogos como os dos games, das proliferações das lan houses, dos tipos de competição a que se propõe, de discutir comportamentos, desde a coleção de cartões telefônicos,cds,mp3, as coleções de figurinhas do desenho animado da tv, dos encontros lúdicos das lanchonetes , da escola, enfim acompanhar, e isso é tarefa também nossa de educadores , entender o que se joga entre os jovens para melhor partilhar da vida.
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