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quinta-feira, 30 de novembro de 2006

São Paulo em Perspectiva
Print ISSN 0102-8839


São Paulo Perspec. vol.16 no.3 São Paulo July/Sept. 2002

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doi: 10.1590/S0102-88392002000300010
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A CONDIÇÃO DA INFORMAÇÃO



ALDO DE ALBUQUERQUE BARRETO






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Resumo: O artigo aborda a instituição da ciência da informação: sua criação como área de conhecimento em 1948 e seu desenvolvimento com orientação teórica e prática para o fenômeno da relação da informação com o conhecimento.
Palavras-chave: ciência da informação; teoria da informação; conhecimento.

Abstract: This article discusses the history of information science: its beginnings in 1948 and its subsequent development, guided by theoretical and practical principles, with the goal of linking information and knowledge.
Key words: information science; information theory; knowledge.


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Em seu inesquecível livro A Condição Humana (1989) Hanna Arendt, para evitar erros de interpretação, logo no início diferencia entre o que classifica de a condição humana e o conceito de natureza humana. A condição humana representa as características essenciais da existência do homem em determinado espaço, visto que sem elas essa existência deixaria de ser humana, ou seja, a vida, a natalidade e a mortalidade, a mundanidade, a pluralidade e o planeta Terra pertencem à condição humana. O problema da natureza humana parece insolúvel, tanto em seu sentido psicológico como filosófico. Ao se lidar com a natureza humana, a essência apresenta-se como obrigação decisiva, em que se possa responder "quem sou eu" e "o que sou eu" ¾ uma questão agostiniana.1 Na natureza humana tanto a questão teológica quanto a da natureza de Deus só podem ser resolvidas dentro da estrutura de uma resposta divinamente revelada.

Para que haja condição humana ¾ o viver do homem na Terra ¾ Arendt relaciona três atividades fundamentais englobadas no que intitulou de vida activa: o labor, o trabalho e a ação.

O labor é a atividade relacionada ao processo biológico do corpo humano: crescimento, metabolismo e seu declínio. Corresponde a uma condição nata de como determinados conhecimentos, um saber implícito, nascem com o homem. A condição humana do labor é a vida. Sua qualidade é de um estoque inicial de informação, que se acumula com o viver da vida.

O trabalho corresponde ao artificialismo da existência humana. Ele produz um mundo de coisas completamente diferentes de qualquer ambiente natural. E é exercido por diversos fluxos. Com o trabalho o homem pratica a troca em todos os sentidos para cumprir sua permanência na Terra. A condição humana do trabalho é a mundanidade. Uma das qualidades dessa condição humana é criação, e o registro, em código próprio, da informação e de sua representação. Com a apropriação e elaboração gera-se o conhecimento.

A ação é a única atividade da condição humana que só pode ser praticada com outros homens. Corresponde à condição humana da pluralidade. A ação é a condição de toda a vida política do homem na Terra. Nela o homem exerce sua qualidade de inteligência para introduzir seu conhecimento no espaço em que convive, com a intenção de modificar para melhor esse espaço, com a finalidade de estabelecer um acréscimo ao bem-estar de seus habitantes.

Este início do trabalho, com a explanação da vida activa, além de prazeroso tem a finalidade de diferenciar na condição da informação seus estoques e seus fluxos, uma questão de confusão freqüente. Falou-se de estoques de informação como o conjunto estático de itens agregado segundo critérios de interesse de uma comunidade de receptores potenciais. São dados em uma memória ¾ seja em dispositivo convencional ou em sistema digital ¾, e inseridos no estoque com a intenção de posterior recuperação. Mencionou-se fluxos de informação quando se referiu ao seguimento, seqüência, sucessão, de eventos dinamicamente produzidos, que determinam o encadeamento ou a vicissitude dos acontecimentos relacionados com as práticas da informação.

Poderia-se, então, ilustrar uma pirâmide de fluxos e estoques com que se ocupam quando se vivencia a condição da informação (Figura 1).








A estrutura piramidal refere-se com a quantidade, mais na base menos no ápice, em uma qualificação de valor subjetivo em que menos é mais.

A pirâmide ilustra a condição da informação, e sua vida activa é determinada pelo conhecimento, a inteligência e o saber. O saber tem, quando se nasce, uma condição de vida igual ao labor; o conhecimento surge pela conquista, pelo trabalho e é inserido nas práticas de uma ação de inteligência com a realidade.

Na base da pirâmide existe, assim, um estoque de fatos, idéias e produtos da sensibilidade humana, institucionalizados ou não, que se transformam em outro estoque de informação.

Entende-se o conhecimento como um fluxo de acontecimentos, isto é, uma sucessão de eventos, que se realizam fora do estoque, na mente de algum ser pensante e em determinado espaço social . É um caminho subjetivo e diferenciado para cada indivíduo. Daí ser incompreensível os conceitos de "gestão do conhecimento" ou "base de dados de conhecimento". Trata-se de um absurdo conceitual, uma impossibilidade técnica, uma falácia ardilosa de um perfeito sofisma.

Quando se fala da inteligência supõe-se a ação de introdução dinâmica de um conhecimento assimilado na realidade do receptor; pode ser caracterizada como uma ação social, política, econômica ou técnica; representa um conjunto de atos voluntários pelo qual o indivíduo re-elabora seu mundo e tenta modificar seu espaço. Trata-se de um início do que não se realizou antes e que só se completa na pluralidade da política e resultará sempre em uma modificação como resultado da ação; ainda que possa ocorrer uma volta, para uma permanência ao estado inicial, o processo em si terá modificado a realidade.

O autor fala em saber quando pensa no conhecimento que aceitou e acumulou nos recipientes de sua mente. É um estoque que se pode chamar para re-elaborar. É um acervo pessoal; mas em uma comunidade adiciona-se , implicitamente, para dar sinais do estado de aprimoramento ou desenvolvimento social e cultural atingidos.



E ASSIM NASCEU A CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO

Os determinantes apresentados anteriormente permitem refletir com mais liberdade a questão da ciência da informação em um desenrolar histórico descritivo, que tem somente a validade de ser a opinião do autor.

O historiador Eric Hobsbawm (1995), analisando o século XX, declara que nos últimos cinqüenta anos a humanidade viu inserir em seu convívio mais inovações do que em todo o resto de sua história. No limiar do período que o historiador refere-se, fatos muito importantes aconteceram. Entre 1945 e 1948, uma bolha tecnológica produziu: a fissão nuclear que fez lançar a primeira bomba atômica; o Eniac e depois o Univac-1, primeiro computador de aplicações gerais; Alexander Fleming descobriu, com ajuda de outros cientistas, a Penicilina em um segundo andar do Hospital St. Mary's em Londres; um avião voou mais rápido do que o som; inventou-se o transistor; foi fundada a Unesco; Norbert Wainer publicou Cybernetics, sobre a teoria matemática da informação; e Vannevar Bush publicou As we may think, apontando o volume, o valor da informação liberada pós-Segunda Guerra.

Acabava a guerra e a informação mantida secreta naquele período seria colocada à disposição do mundo. Designado pelo presidente Roosevelt, o Dr. Vannevar Bush foi de 1938 a 1942 o responsável pelo Comitê Nacional de Pesquisa depois Office for Scientific Research and Development; sua missão foi congregar cerca de 6 mil cientistas americanos e europeus para direcioná-los ao esforço de guerra. Em 1945, Bush escreveu As we may think e o problema da informação em ciência e tecnologia e possíveis entraves que haveriam para organizar e repassar à sociedade as informações mantidas secretas durante a guerra. Os entraves eram: a) na formação dos recursos humanos; b) no instrumental de armazenamento e recuperação; e c) no arcabouço teórico existente para a organização e controle da explosão de informação gerada durante a guerra.

O artigo de Bush apareceu primeiro em 1939, em uma carta ao editor da revista Fortune, teve sua histórica versão no periódico Atlantic Monthly e posteriormente a revista Life fez várias observações e chamadas sobre o trabalho. Isso era o máximo de exposição, que uma questão, nesse caso um problema de informação, poderia ter na mídia da época. Vannevar Bush pode ser considerado o precursor da ciência da informação e 1945 a data fundadora com a publicação de seu artigo; ele indicou uma mudança de paradigma para a área de informação em ciência e tecnologia, que envolvia: profissionais, instrumentos de trabalho para armazenagem e recuperação da informação; argumentou sobre o desuso das condições teóricas da representação da informação para processamento e armazenagem e recuperação.

Bush introduziu a noção de associação de conceitos ou palavras na organização da informação, pois este seria o padrão que o cérebro humano utiliza para transformar informação em conhecimento. Indicou que os sistemas de classificação e indexação, existentes à época, eram limitativos e não intuitivos. Os processos para armazenar e recuperar informação deveriam ser operacionalizados por associação de conceitos "como nós pensamos". A formação do profissional de informação foi dita conservadora para a época; indicou a deficiência nos aparatos de armazenamento e recuperação da informação e propôs o Memex ¾ um apetrecho tecnológico que armazenava e recuperava documentos mediante associação de palavras; especialmente, advertiu que a base teórica na construção dos sistemas de armazenamento e recuperação da informação além de ultrapassada estava errada.

As idéias de Bush provocaram tamanho frisson na época, que foram parar em Londres. Em 1946, um ano após o término da Segunda Guerra, foi realizada em Londres a Royal Empire Society Scientific Conference, onde se discutiu muito pouco sobre informação, mas que levou à realização, em 1948, da Royal Society Scientific Information Conference. Cerca de 340 cientistas e documentalistas de todo o mundo compareceram a essa Conferência, que durou dez dias úteis. Os seus Proceedings (1958) têm 723 páginas, com dois volumes e quatro seções: I ¾ as publicações originais, II ¾ serviços de resumo, III ¾ indexação e outros serviços de Biblioteca, IV ¾ revisões de literatura e relatórios anuais.

A publicação dos proceedings levou dez anos para sair e foi editada nos Estados Unidos. Os cientistas de quase todas as áreas tinham propostas para resolver os problemas da gestão da informação, mas para não perder o status acadêmico, a nova área foi criada com o nome de: ciência da informação. Os resultados da Conferência, apesar das 723 páginas, ficaram muito perto dos problemas apontados por Vannevar Bush.

Na Inglaterra, e no resto do mundo, esses acontecimentos, desde a publicação do As we may think até a Conferência de 1948 da Royal Society, provocaram uma dissensão com a Biblioteconomia que durou perto de 30 anos. Um ano após a Conferência da Royal Society de Londres, Jason Farradane, J. Bernal e outros criaram o Institute for Information Scientists,2 para acolher as novas idéias e os novos pesquisadores surgidos nessa "nova" área.

Nessa mesma época, em 1952, foi criada pelo grupo dos cientistas da informação o Classification Research Group,3,4 para propor novas teorias para armazenar e recuperar a informação; o problema da época era o grande volume de informação e sua gestão. Os profissionais que fundaram o Institute for Information Scientists criaram sob o comando de Jason Farradane o primeiro curso de pós-graduação em ciência da informação na The City University,5 anteriormente o Northampton College of High Technology, localizado na City de Londres, Inglaterra. Precurssora a área foi criada em uma Faculdade de alta tecnologia e vinculada inicialmente ao Centro de Administração e Negócios (Business Administration Centre).

Quanto ao computador, a ciência da informação e a informação só tiveram acesso a máquina, cerca de 35 anos depois quando o custo da memória magnética baixou, a partir de 1980, e permitiu o processamento de textos em linguagem natural.



FLUXOS DE INFORMAÇÃO E CONHECIMENTO

A ciência da informação passou a ser uma instituição de reflexão da informação, como um campo, que estuda a ação mediadora entre informação e conhecimento acontecido no indivíduo. Nesse sentido, a ciência da informação difere da biblioteconomia, pelo valor colocado no foco com que cada área "reflete" a importância relativa dos fluxos de informação, que são internos e os voltados para o exterior em um sistema de armazenamento e recuperação da informação.

A biblioteconomia objetiva, essencialmente, o fluxo interno a seu sistema, que abrange seleção, aquisição, catalogação, classificação, indexação, armazenamento, recuperação e disponibilidade para uso de itens de informação.

A ciência da informação introduz um pensamento mais direcionado aos fluxos externos, localizados nas extremidades desse fluxo interno a que se referiu anteriormente.

Em uma das extremidades há a criação da informação e na outra a assimilação da informação pelo receptor, algo que vai além, transcende o conceito de uso da informação (Figura 2).








Esta é a condição da informação, a de harmonizar o mundo. Como elemento organizador, a informação referencia o homem a seu destino; desde antes de seu nascimento, com sua identidade genética, e durante sua existência pela capacidade em relacionar suas memórias do passado com uma perspectiva de futuro e assim estabelecer diretrizes para realizar sua aventura individual no espaço e no tempo.

Por conseguinte, tem-se procurado caracterizar a essência do fenômeno da informação como a adequação de um processo de comunicação que se efetiva entre emissor e receptor da mensagem. As configurações, que relacionam a informação com a geração de conhecimento, são as que melhor explicam sua natureza, conforme finalistas, pois são associadas ao desenvolvimento do indivíduo e à sua liberdade, pelo poder de decidir sua vida. Aqui a informação é qualificada como instrumento modificador da consciência do homem. Quando adequadamente apropriada, produz conhecimento e modifica o estoque mental de saber do indivíduo; traz benefícios para seu desenvolvimento e para o bem-estar da sociedade em que ele vive.

Na criação da informação pelo emissor criador, o autor é algo desconhecido e ainda pouco estudado. Representa uma transmutação,6 mais que uma transferência da informação. A transferência tem uma conotação de passagem, deslocamento; a transmutação coloca-se como formação de nova espécie por meio de mutações; pode ser vista como uma reconstrução de estruturas significantes; uma transformação que ocorre mediante uma reação de mudança de uma estrutura em outra. De uma condição privada do agente criador para um conjunto simbolicamente significante, um ambiente público, uma coletividade.

Nos extremos do fluxo, há dois momentos: o da criação e o da assimilação da informação, que acontecem e traduzem um desenrolar ritualístico; fazem parte da Essência mais rara e surpreendente da transferência da informação: a (in)tensão da passagem e a solidão fundamental.

O ritual de passagem de uma estrutura de informação de seu agente emissor para o receptor é um acontecimento admirável, pois se relaciona a uma intenção de passagem e a solidão fundamental de todo ser humano.

O momento da intencionalidade aparece como o atributo de uma mensagem de informação ao ser propositadamente direcionada, de ser arbitrária para atingir seu destino; esse direcionamento intenso produz tensão, que é criada pela interação de competências distintas existentes nos diferentes mundos: o mundo do emissor da mensagem e o mundo de referências do receptor, colocado em sua realidade de convivência e para onde o conhecimento se destina.

Em um segundo momento, dos fluxos extremos,7 acontece a solidão fundamental, condição de todo ser humano (Ricoeur, 1976), e expressa a condição do sujeito em relação a sua experiência vivenciada.

Quando se vive uma vida pensante ¾ que é o local onde se projeta a criação da informação antes de codificá-la ¾, isto acontece na mais escondida privacidade. Essa é a solidão fundamental de todos os que criam uma informação. É por meio da informação produzida, com a ajuda de um sistema de signos, que o homem procura relatar sua experiência vivenciada para outras pessoas; espalhar a outros sua experiência, que foi experimentada só por ele; que se processou no âmago de sua condição privada de criação individual e que se desloca para a esfera pública de uma significação, que se deseja, seja coletiva.

Todo ato de conhecimento associado ao conteúdo simbólico de uma estrutura de informação é uma cerimônia com ritos próprios, uma passagem simbólica, mediada por uma condição de solidão fundamental tanto para o emissor quanto para o receptor da informação, uma cerimônia que acontece em mundos diferentes.

Como no mito de Orfeu, a informação em seus momentos de passagem é cidadã de dois mundos, com direção, mas carregando enorme tensão no ritual de passagem. No entanto, é nos momentos de passagem que o fenômeno da informação apresenta sua característica mais bela, pois transcende ali a solidão fundamental do ser humano: o pensamento se faz informação e a informação se faz conhecimento.



TRÊS TEMPOS DA CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO

Voltado ao desenvolvimento da ciência da informação como uma instituição mediadora da relação informação e conhecimento, vê-se tempos distintos, se se quiser analisar sua história:

- Tempo da gerência de informação que vai de 1945 a 1980;

- Tempo da relação informação e conhecimento no período de 1980 a 1995;

- Tempo do conhecimento interativo de 1995 até os dias atuais.

Tempo da Gerência de Informação

Ao indicar três tempos para a ciência da informação não se pretende uma separação de práticas e idéias em tempos fechados. A intenção foi assinalar o pendor para determinado ponto, de acordo com o pensar da época. As questões de gerência de informação, por exemplo, têm uma constância que se abrigam até os dias atuais. Entretanto, durante os anos contíguos ao pós-guerra, este era o principal problema a ser resolvido. Ordenar, organizar e controlar uma explosão de informação, para o qual o instrumental e as teorias da época não tinham uma solução preparada.

Existem áreas que culturalmente produzem seus artefatos de pesquisa, como a astronomia, que não inicia nova pesquisa sem que seus instrumentos estejam disponíveis. O Memex foi uma proposta da área de informação, para produzir um aparato próprio. A ciência da informação, porém, como tantas outras áreas, empresta apetrechos de outros campos; no caso do computador esperou-se de 1950 a 1980 para uma utilização própria no processar, armazenar e recuperar documentos textuais.

Todavia, no tempo da gestão foi necessário estabelecer uma metodologia de reformatação do documento, baseado em sua substituição por indicadores do conteúdo do documento todo. Portanto, um documento de 300 páginas era substituído por suas informações bibliográficas de localização e um determinado número de palavras-chave. Essas palavras pretendiam representar o conteúdo inteiro do documento.

Assessorava esse ocultamento da informação ¾ um universo simbólico privado ¾ uma metalinguagem usurpada da linguagem natural; representada por uma linguagem, dita controlada, no pressuposto de que usando-se menos palavras para identificar o documento na entrada, sua recuperação seria facilitada na saída.

A era da gestão trouxe o esplendor das classificações, indexações, tesauros, medidas de eficiência na recuperação do documento como: recall e precision.8

Os eventos dessa premissa técnica e produtivistas, tempo da gestão, foram tão fortes que dominam a área há 50 anos; formam uma ideologia interna dos sistemas de armazenamento e recuperação da informação, e, ainda hoje, refere-se a conceitos como relevância9 e precisão com sua conotação cinqüentenária, sem lembrar que o problema, os pressupostos, a metodologia e a tecnologia mudaram.

Todavia, esse era o problema de uma época e tinha de ser resolvido. Com a baixa do custo de armazenagem, o computador foi sendo liberado para os problemas de informação, possibilitando, então, lidar com a questão do volume e do controle da informação. Esse problema deixou de ser o prioritário, embora as questões de gestão de estoques de informação estejam mais atuais que nunca.

Tempo da Relação Informação e Conhecimento

Existem controvérsias quanto às raízes do cognitivismo como um pensamento predominante de um período. Parece haver alguma concordância de que teve início em um Simpósio sobre Teoria da Informação, realizado no Massachusetts Institute of Technology, em setembro de 1956, onde cientistas importantes no desenvolvimento do novo pensar apresentaram artigos inéditos: Herbert Simon, Noan Chomsky e Claude Shanhon (Gardner, 1985).

O certo é que nos anos 60 encontram-se os principais autores e atores do cognitivismo ou da Ciência da Cognição, estudando o comportamento assimilado por conhecimento em seres humanos, máquinas e na interação dos dois. Na década de 60, as características do refletir cognitivista estavam em todos os campos da ciência e quem explicasse seu projeto sem uma base conceitual cognitivista corria sério risco de isolamento (Meheler e Franck, 1995).

Na ciência da informação o cognitivismo chegou na década de 70 introduzido por: Belkin e Robertson (1976), Wersig e por Nevelling (1975) e por projetos como o Project in Scientific Information Exchange in Psycology da American Psychological Association, o trabalho do Center for Research in Scientific Communication da John Hopkin University e o INFROSS Project na Universidade de Bath, Inglaterra que estudou projetos de sistemas de informação para ciências sociais (Adam, 1975).

A condição da informação passou a ser sua "in-tensão" para gerar o conhecimento no indivíduo e conseqüentemente em sua realidade.

O conhecimento, destino da informação, é organizado em estruturas mentais por meio das quais um sujeito assimila a "coisa" informação. Conhecer é um ato de interpretação individual, uma apropriação do objeto informação pelas estruturas mentais de cada sujeito. Acredita-se que estruturas mentais não são pré-formatadas, com intuito de serem programadas nos genes. As estruturas mentais são construídas pelo sujeito sensível, que percebe o meio. A geração de conhecimento é uma reconstrução das estruturas mentais do indivíduo realizado por meio de suas competências cognitivas, ou seja, é uma modificação em seu estoque mental de saber acumulado, resultante de uma interação com uma forma de informação. Essa reconstrução pode alterar o estado de conhecimento do indivíduo, ou porque aumenta seu estoque de saber acumulado, ou porque sedimenta saber já estocado, ou porque reformula saber anteriormente estocado. No entanto, como diria Derrida (1995), esta é mais uma aventura do olhar, do que uma maneira de questionar o objeto em si.

Com a ênfase na relação da informação e do conhecimento, modificou-se a importância relativa da gestão dos estoques de informação passando-se a apreciar a ação de informação na coletividade. Se antes havia uma razão prática e uma premissa técnica e produtivista para a administração e o controle dos estoques, agora a reflexão, o ensino e a pesquisa passaram a considerar as condições da melhor forma de passagem da informação para a realidade dos receptores; a promessa do conhecimento teria que considerar o indivíduo, seu bem-estar e suas competências para assenhorear-se da informação. E a premissa transformou-se em promessa.

Considerando a Figura 1, o foco deslocou-se para o fluxo da extremidade direita, para um fluxo extremo. É uma condição da informação: ela só se explica se é aceita como tal e o conhecimento só se realiza na consciência dos receptores da informação.

Tempo do Conhecimento Interativo

Localizou-se esse momento, a partir de 1990, para caracterizar que o conhecimento assumiu novo status após a Internet e, sobretudo, a world wide web, embora os primeiros esforços de uma rede mundial de computadores apareçam em 1972 com uma mostra pública da Arpanet, que ligou 40 computadores.

Foi só em 1989 que Tim Berners-Lee, cidadão inglês, tecnologista da informação, trabalhando no European Organization for Nuclear Research Center ¾ Cern, escreveu os primeiros softwares que permitiram a atual configuração gráfica da web (o que você vê, é o que você consegue ter) e dessa forma o desenvolvimento popular da Internet.

São as novas tecnologias de informação e comunicação que modificaram aspectos fundamentais, tanto da condição da informação quanto da condição da comunicação. Essas tecnologias intensas modificaram radicalmente a qualificação de tempo e espaço entre as relações do emissor, os estoques e os receptores da informação.

Quando se fala em novas tecnologias de informação pensa-se de imediato no computador, na telecomunicação e na convergência da base tecnológica, que permitiram que todos os insumos de informação fossem convertidos para uma base digital, possibilitando, assim, seguir o mesmo canal de comunicação.

Contudo, essas são pobres conquistas de apetrechos ilusórios e efêmeros: conjuntos fantasmagóricos de fios, fibras, circuitos e tubos de raio catodo. As reais modificações advindas das tecnologias intensas de informação trouxeram ao ambiente um novo elaborar do conhecimento e foram as modificações relacionadas ao tempo e ao espaço de sua passagem.

Os espaços de informação agregaram em um mesmo ambiente de comunicação os estoques de itens de informação, as memórias, os meios de transferência e a realidade de convívio dos receptores de informação como na Figura 3.








A velocidade da informação nas trocas entre o estoque e a realidade em uma abstração matemática tende ao infinito com as novas tecnologias de comunicação. No ciberespaço, as trocas de informação realizam-se em tempo real, tendendo a zero, dada a velocidade infinita dessas transferências.

A fórmula habitualmente usada para cálculo da velocidade expressa-se em: função do tempo gasto para percorrer determinado espaço em uma dada realidade, ou seja:

V = e / t (a)

em que V= velocidade e = espaço t = tempo.

Se considerar que a velocidade de transporte da informação no ciberespaço tende ao infinito, simplesmente operando a fórmula expressa em (a) temos que tanto o tempo como o espaço tendem para ser zero.

Como espaço isso leva a contigüidade universal. O vizinho com que se tem afetividade informacional pode estar tanto na sala ao lado quanto na Finlândia. A velocidade com que se comunica com cada um deles, para troca de informações, é basicamente a mesma.

Com o tempo tendendo, também, a zero, ofusca-se o passado e o futuro. O tempo real no ciberespaço é o aqui e agora. Passado e futuro, sem perder suas qualidades, como que desabam no presente, encurtam-se no tempo presente do cotidiano.

A assimilação da informação no ciberespaço acontece em um ponto do presente que se repete cotidianamente ao infinito; ainda que conservando a qualidade das vivências do passado e o sonho do futuro. O ponto de apropriação da informação e do conhecimento tem no presente sua única dimensão do tempo.

Como ficará o pensar, o querer e o julgar nessas novas configurações de tempo e de espaço e informação. Não se sabe, mas considera-se que de nada adiantará se as modificações não acontecerem em cada um. Pergunta-se como Santo Agostinho: "o que me adianta que esta geração esteja sempre acontecendo, se não acontece em mim? Tudo depende, pois, dela acontecer em mim" (Mestre Eckehart, 1987).



NOTAS

1. De Santo Agostinho, em seus escritos.
2. Institute for Information Scientists .
3. Michael Lesk (2001) separa no tempo, com explicações necessárias, a história dos sistemas tradicionais de armazenamento e recuperação da informação, desde seu nascimento até sua morte.
4. Classification Research Group .
5. The City University .
6. Transmutação: converter, alterar, transformar.
7. Fluxos extremos: o que está no ponto mais afastado; remoto, distante, longínquo.
8. Recuperação e Precisão: medidas estabelecidas por Cyril Cleverdon, no Reino Unido, em experiências com a produtividade de linguagens de indexação. Trabalhou no Cranfield College, no final dos anos 60.
9. O termo relevância para indicar uma informação útil a determinado receptor tem amplo uso. Está-se referindo a conotação matemática indicada pelas experiências em Cranfield, Inglaterra por Cyril Cleverdon.



REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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ARENDT, H. A condição humana. Rio de Janeiro, Forense Universitária, 1989.

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GARDNER, H. The mind's new science. Basic Books, Nova York, 1985.

HOBSBAWM, E. Era dos extremos ¾ o breve século XX. São Paulo, Cia. das Letras, 1995.

LESK. M. The seven ages of information retrieval. Disponível em: .

MEHELER, J. E FRANCK, S. (ed.). Cognition on cognition. Londres, MIT Press, 1995.

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WERSIG, G. E NEVELLING, U. "The phenomena of interest to information science". Journal of the Institute of Information Scientist, v.9, n.4, 1975.





ALDO DE ALBUQUERQUE BARRETO: Pesquisador Titular do Ministério da Ciência e Tecnologia, Presidente da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da Informação (aldoibct@alternex.com.br).


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